Literatura e Blog

O assunto literatura e blog é bastante discutido na cena literária atual. Desde os escritores que estão fazendo sucesso aqui no Brasil, passando por aqueles que ainda se encontram no anonimato até vecendores do Nobel, como o escritor português José Saramago, não são poucos os que se aventuram na blogosfera, publicando uma coisa ou outra em seus blogs pessoais. Até eu que não sou bobo nem nada ando postando meus contos e algumas crônicas nos meus blogs e em blogs de outros também...
No começo, fui convencido de que blog é uma coisa e literatura é outra. Quem me convenceu disto foi a escritora Clarah Averbuck, que tem um blog chamado “Brasileira Preta”. Diz ela:

"Só pra avisar, eu não respondo perguntas sobre blogs. Eu não dou entrevistas sobre blogs nem participo de trabalhos de faculdade sobre blogs. Eu simplesmente não agüento mais essa baboseira de blogs. Chega. Blog não passa de um meio de publicação. O autor do blog, dono e soberano do blog, faz o que bem entender com seu blog. Não existe literatura de blog. Não existe escritor de blog. Blogueiro não é escritor. Escritor não é blogueiro. Não existe escritor de blog. Existe blog enquanto meio de publicação para um escritor. Escritor é escritor. Escritor não é blogueiro. Não sei nada sobre o fenômeno blog. Sequer acho que seja um fenômeno. Nunca mais respondo nenhuma pergunta sobre blog. Por favor, não me incomodem com essas coisas. Sou uma grávida tensa, isso não faz bem. Sem mais..."

Sensacional, mas serve apenas para impressionar. Pelo menos, ela nos dá uma informação à respeito de quais são as perguntas. Ei-las: existe uma literatura de blog? Uma literatura blogueira? Blogueiro é um escritor? O escritor é um blogueiro? Ou tudo não passa de um sonho dentro do outro?

Muitos críticos literários condenam a literatura produzida em blogs por um motivo apenas: os blogueiros vão publicando tudo o que escrevem, sem revisão, sem esforços, e por isso uma porcariada de literatura "c" vem se proliferando nos meios de comunicação. Se eu fosse eles, prescrevem os críticos, parava de escrever e de publicar em blog o quanto é tempo, antes que a peste acabe contaminando aqueles que além de ter talento, sofrem em infinitas revisões antes de lançar algo num livro impresso e bem bonito, com a marca da Cia da Letras e tudo o mais...

Parece que todo mundo anda confuso, sem saber o que é literatura e o que é blog. Realmente, blog é um meio, mas não apenas isto: é a mesa de bar entre o escritor e seus leitores - "mesa de bar", e não uma bancada, com o autor aqui e os leitores lá, sentados nas cadeiras do auditório...
Nessa mesa de bar, o leitor fica mais à vontade para comentar, sugerir, criticar e inclusive elogiar. É aqui que o escritor deixa de ser solipsista para se tornar comunitário. Ele desce do salto e entra no meio do povo, a fim de sofrer o processo de aprendizado do mundo da vida. Tudo então se transforma: autor, leitor, texto, interpretação e compressão - o texto, em muitos casos, já não é o mesmo.

Não que ele muda necessariamente, mas a visão que o autor tem sobre a sua própria obra se amplia, e o mesmo acontece com os leitores que prestam atenção nos comentários dos outros. Aliás, se o comentário fosse usado com honestidade, uma vez que a maioria dos comentadores são gente falsa que apenas o faz para promover o blog que ele também tem, a literatura produzida em blog melhoraria num grau bem maior...

Em poucas palavras, a literatura produzida em blogs passa por um processo de transformação, antes de ser publicadas em livros impressos ou até mesmo em arquivos pdf. São muitos os textos de escritores que tem um certo sucesso atual que passaram por esta transformação. Gente que não tinha muita idéia do que realmente significava a sua literatura, mas que, através dos comentários, das criticas, das sugestões, foram melhorando a comprenssão que tinham de si.

Mas, isto não é tudo. Aqui falo apenas dos textos prontos, ou, na melhor das hipóteses, que o escritor considerava como acabado. E os textos que desafiam o próprio autor e por conseguinte o leitor também? E aqueles textos que nascem de uma idéia, querem ser escritos, e o autor se propõe fazer ao vivo, de pouco em pouco, ou de capítulo à capítulo?

Ainda não tive essa audácia. Tenho três a quatro romances que só sei o começo, que pode dar muito pano para manga, mas, fazê-los assim, na frente de todo mundo, não sei se teria a coragem. Os leitores vão interferir, vão brigar, vão querer escolher o fim, o assunto do próximo capítulo, vão questionar seus critérios, as suas impulsões... E aí? É o mesmo que dar aula no ensino fundamental e médio. É o mesmo que apresentar uma dissertação ou tese no meio de um bando de intelectuais famintos pela auto-afirmação. É se lançar no morro para ver o que os bandidos e traficantes fazem com a gente...

Portanto, há sim uma literatura de blog. Uma literatura completamente diferente daquela do escritor solipsista que primeiro solitariamente escreve, depois passa para alguns verem e finalmente manda para a editora com toda a defesa necessária. Uma literatura pronta, com direito apenas de elogios e criticas, nada mais. Uma literatura bem diferente da escrita no blog: pronta para o diálogo, pronto para modificar-se, transformar-se, e, quem sabe, dependendo de quem conduz, melhorar-se.

Glauber da Rocha.

0 comentários:



Postar um comentário